Quando o professor de português Romário Sena, 29 anos, pediu que a turma do fundamental analisasse um texto da escritora bell hooks, ele esperava alguns parágrafos relacionando o conteúdo com os assuntos discutidos durante as aulas, mas um grupo de alunas resolveu transformar o texto em um debate, com mediador e tudo, o que deixou o professor feliz e o trabalho mais dinâmico e divertido. Já os meninos, seguiram o modelo tradicional e tiveram notas medianas.
Uma pesquisa realizada pelo Observatório da Branquitude, divulgada nesta terça-feira (29), relevou que meninas têm desempenho melhor em português do que meninos, mas que eles são melhores que elas em matemática, e que brancos têm melhores notas que negros nas duas disciplinas. A coordenadora da pesquisa, Carol Canegal, explicou que usou os dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) que avalia o desempenho dos estudantes do 9º ano em Língua Portuguesa e Matemática no Brasil.
"Quando a gente olha para grupos brancos e grupos negros no Brasil, pessoas negras historicamente acumulam um panorama de defasagem nas diferentes etapas educacionais. Existe um acúmulo de uma situação desvantajosa, o que aponta para a importância das políticas setorizadas capazes de mobilizar as dimensões de raça, de gênero e de território rumo a um ambiente escolar mais equitativo", diz Carol.
As provas foram aplicadas para estudantes da rede pública e de escolas privadas em outubro e novembro de 2023, e o resultado final foi divulgado em agosto. Canegal explicou que o objetivo da pesquisa é fornecer mais informações para a construção de políticas públicas, lembrou que o ensino fundamental é de responsabilidade das prefeituras e que o Brasil acabou de escolher os novos gestores municipais. Um trecho da pesquisa destaca as diferenças entre meninos e meninas.
"Os estereótipos de gênero costumam associar o universo feminino à sensibilidade e subjetividade, características conectadas a disciplinas como Português, 'feminizadas'. Já o masculino relaciona-se à razão e à objetividade caras às ditas ciências duras, como a Matemática. Tais concepções fincadas no senso comum podem afetar o processo de escolarização, uma vez que as ciências não são neutras, gerando prejuízos na apreensão dos conteúdos pelos estudantes", diz o estudo.
A pesquisadora frisou que essas construções sociais podem se reproduzir nas escolhas profissionais impactando diretamente no mercado de trabalho. O professor Romário passou os últimos dez anos dando aula para estudantes da rede pública e privada e conta que quando pergunta aos alunos qual carreira pretender seguir, meninas escolhem áreas ligadas às ciências humanas ou biológicas, como Direito, Pedagogia e Medicina. Já os meninos querem ser jogador de futebol ou policial.
"Acredito que é muito mais uma questão de como a menina é educada, da atenção que é dada às atividades, maior que os meninos. Sobre a questão racial, existe um fator social. Pessoas brancas, em sua maioria, têm oportunidades e acesso a coisas que pessoas negras não conseguem. Tenho três alunos que não estavam indo para a escola e descobrimos que era porque eles não tinham o que comer", disse.
Bahia
Os dados revelaram também que estudantes da Bahia tem 3º pior desempenho em Matemática e 4º pior desempenho em Língua Portuguesa no Nordeste. A Bahia marcou 229.3 pontos no Saeb em Matemática, ficando à frente apenas do Rio Grande do Norte (228.8) e do Maranhão (217.5). No Nordeste, o Ceará teve a pontuação mais alta nessa categoria, com 243.3. No Brasil, a nota mais alta foi em Santa Cataria (252.7). O estudante Davi Conceição, 14 anos, contou que tem algumas dificuldades.
"Acredito que o mais difícil é relacionar as fórmulas com as questões do dia a dia. Eu gosto muito de matemática, gosto mais do que outras disciplinas mais ligadas às áreas de humanas, mas tem situações que eu penso 'por que estou apreendendo isso?'. Eu quero fazer faculdade de Física, então, estou me dedicando", contou.
Em Língua Portuguesa, a Bahia marcou 230.3 e superou Sergipe (228.7), Alagoas (228.4) e Maranhão (221.1). O Ceará novamente foi o que teve o melhor resultado no Nordeste, com 243.6. No Brasil, a melhor nota foi também de Santa Catarina (250.4). Nas duas disciplinas os baianos ficaram dez pontos abaixo da média nacional em Língua Portuguesa (239.8) e Matemática (239.4).
O Observatório da Branquitude é uma iniciativa da sociedade civil que pesquisa a branquitude e suas estruturas de poder, materiais e simbólicas. Os pesquisadores analisam a identidade racial branca e os efeitos dela na sociedade. O estudo divulgado nesta terça-feira foi construído durante dois meses.
Confira o ranking dos estados do Nordeste:
Língua Portuguesa
Ceará (243.6)
Piauí (236.2)
Pernambuco (234.9)
Rio Grande do Norte (231.6)
Paraíba (230.9)
Bahia (230.3)
Sergipe (228.7)
Alagoas (228.4)
Maranhão (221.1)
Matemática
Ceará (243.3)
Piauí (236.9)
Pernambuco (236.2)
Alagoas (231.2)
Paraíba (230.3)
Sergipe (230.3)
Bahia (229.3)
Rio Grande do Norte (228.8)
Maranhão (217.5)
Confira o ranking da Bahia em Língua Portuguesa:
Meninas brancas (251.3)
Meninas negras (247.5)
Meninos brancos (240.2)
Meninos negros (236.4)
Confira o ranking da Bahia em Matemática:
Meninos brancos (246.6)
Meninos negros (243.3)
Meninas brancas (236.1)
Meninas negras (233.8)
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